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quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Um passo atrás para dar muitos a frente.

Esse blog tinha uma função poética, de construção imagética de assuntos relacionados ao exílio e, em especial, à causa saharaui, mas com a ida aos acampamentos e conhecendo melhor a realidade e o movimento de libertação do povo, é necessário dar um passo atrás e cumprir com a função de divulgação dos dados históricos e reais desse povo. 
Afinal, informações erradas (como baixa temperatura a noite – sim, elas existem, mas não nesse período do ano, ou então, que nunca chovia no deserto – sim, choveu, pouco, mas caiu água do céu) até falta de informações em português sobre a história desse povo e sua organização social ficaram explícitas durante a viagem e, claro, foram motivos de piadas em diversos momentos (ok, eu assumo! rs).

Mas, vamos lá na tentativa de mudar, recomecemos:

Cinzia Terzi, vice-presidenta da Associação Jaima Sahrawi e pesquisadora do  povo saharaui,  disse-me: “Uma nação só acontece quando se deseja ser nação. A declaração de uma nação parte do desejo, parte da ânsia de ser reconhecido como tal, assim acontece com a RASD – Republica Arabe Saharaui Democratica.” 

O povo saharaui nasce do encontro da população árabe com os nômade berberes e que dizer literalmente, “gente do deserto”. 
Desse encontro, nasce uma população ligada pelo islamismo sunita e por uma língua única “hassanya” (muito próxima ao árabe clássico), dando uma identidade própria à região do Sahara Ocidental. 

Antes da chegada dos colonizadores, eles se dividiam socialmente em camadas, que podemos visualizar como pirâmide. 
No ponto mais alto da pirâmide haviam: 
1- Os cultos, que dominavam os saberes: religioso e as ciências. 
2-Os guerreiros, que asseguravam a defesa do território e da população. 

Descendo na piramide, encontravam-se: 
1- Pastores e agricultores, que em busca de proteção espiritual e armada, pagavam impostos. 
2- Abaixo desses haviam os escravos livres e outros trabalhadores. 

Essa estrutura social era mantida, por um poder central, pelos chefes da tribo, denominado “Conselho dos Quarenta”. 

A Colônia 
A questão do Sahara Ocidental e seu processo de colonização tem como marco a data de 1884, quando a Espanha funda a sua colonia no Rio de Ouro, no Congresso de Berlim. 
Nesse mesmo período, a França e a Espanha definem o território que cabia a cada uma, assim também o Marrocos estava sobre domínio de seus colonos franceses. Em torno de 1890, nasce o primeiro movimento anticolonialista saharaui, com a tribo guerreira “Uld-Delim”. 
Entre os anos de 1900 – 1920, a Espanha e a França, a partir de muitos acordos, decidem as areas de influencias de cada país: Marrocos, Mauritânia e Argélia (França) e Sahara Ocidental (Espanha). 

Em 1949, descobre-se no território o maior centro de fosfato do mundo. 
Em 02 de março de 1956, acontece o processo de descolonização do Marrocos pela França. 
Em 1958, a Espanha divide o território em dois centros administrativas: Rio de Ouro ao sul e, Sanguia El Hamra ao norte, que formavam a província espanhola “Sahara Espanhol”. 
Os conflitos com o Marrocos já são aquecidos nesse momento com o desejo desse país pela construção do “Grande Marrocos”. 
Em 1960, a Argélia torna-se independente. 
Em 1962, independência da Mauritânia. 

Descolonização e traição. 
Os movimentos de libertação da colônia espanhola aumenta nesse período, surgem movimentos nacionalista, anticoloniais. 
Em 1968, cria-se o movimento de Libertação de Sanguia El Hamra e Rio de Ouro. Em 1973 funda-se a Frente Polisario (Frente popular de libertação de Sanguia El Hamra e Rio de Ouro) e o principal objetivo desse movimento que começou clandestinamente e foi se tornando cada vez mais forte e estratégico era a independência do Sahara e a reformulação e enfrentamento do que seria o “Grande Marrocos”, já prevendo o desejo do mesmo sobre o seu território. 
Em 1974, a Espanha propõe um referendo ao Secretariado Geral da Onu que poderia dar a autodeterminação ao povo saharaui. Por esse motivo começa um censo da população naquele momento para o acontecimento da votação. Em 1975, a corte de Aia envia uma delegação da ONU, para verificar a viabilidade do referendo de autodeterminação. Essa corte indica que aquela era uma terra “nula” e que nem o marrocos, nem a Mauritânia tinham qualquer historia sobre o território que poderiam dar qualquer vestígio de vínculo com a área e propõe a continuidade do referendo. O Marrocos, que há muito desejava aquela região se sente desprivilegiado. 
Em 17 de outubro de 1975, um acordo secreto entre a Espanha e o Marrocos, e contra a decisão da ONU de um referendo, permitem o acontecimento da Marcha Verde, no qual 350.000 marroquinos invadem o Sahara Ocidental. 
Em 14 de novembro de 1975, é firmado um acordo entre Espanha, Marrocos e Mauritânia. A Espanha concede o território a esses dois países que iniciam a invasão: ao norte pelo Marrocos e ao sul pela Mauritânia. Tem inicio a retirada dos saharauis. A Frente Polisario resiste de todas as formas, apesar dos bombardeios com Napalm feitos pelos aviões marroquinos. A população que consegue foge para a Argélia, para a cidade de Tindouf e cria-se ali o primeiro acampamento de refugiados. 

Em 27 de Fevereiro de 1976, a Frente Polisario proclama a RASD – Republica Arabe Saharaui Democratica. Decretada no Exílio, que permitiu e assumiu a retirada do poder da Espanha sobre as decisões da população saharaui. 
Em 05 de agosto de 1979, é declarada a paz entre a RASD e a Mauritânia, que retiram as suas tropas. 

O Muro 
Em 1980, a Frente Polisario já havia reconquistado uma pequena parte de seu território, conhecido ainda hoje como Territorio Livre.
Frente a esse fato, Hassan II dá inicio a construção do Muro de areia. 
De 1981 a 1986, o Marrocos se dedica a construção desse muro, que possui mais de 2.500 km de extensão partindo do sul do Marrocos até a costa Atlântica, divisa com a Mauritânia. Além da construção do muro, o Marrocos se encarregou de minar toda a região ao redor do muro, de construir base militares fortemente armadas e com sistema eletrônico em defesa do que eles declararam ser o seu território, dando inicio a uma nova colonização/exploração da região. 

Em 1984, a RASD é reconhecida pela Organização da União Africana, esse fato faz com que o Marrocos saia da Organização.
Em 25 de setembro de 1987, a Onu decide enviar uma missão na região para estudar uma maneira de cessar fogo e finalizar o conflito na região. 
Em agosto de 1988, um acordo de Paz elaborado pelo Secretario Geral da ONU, propõe uma resolução pacífica para a região. 
Em 6 de setembro de 1991, acontece o cessar fogo e a criação da Minurso ( Missão da Nações Unidas por um Referendo no Sahara Ocidental), traçando como data prevista para a votação o dia 26 de janeiro de 1992.

A data determinada pela ONU para a votação é boicotada pelo Rei Hassan II do Marrocos. Desde então, o Marrocos tem ocupado a região, enviando marroquinos para viverem no território para assim, expulsar e diminuir a população saharaui no Sahara Ocidental, dificultando a realização do referendo. 

Atualmente, os saharauis estão divididos em 3 partes: 
1- Acampamentos de Refugiados, localizados em Tindouf, Argélia, com cerca de 200.000 pessoas vivendo em situação de exílio, num ambiente inóspito e pouco propício a vida humana, dependentes sobretudo de ajuda humanitária para viver.
2- Territórios Ocupados, uma parcela da população saharaui, que não conseguiu fugir durante a guerra permanece ainda no Sahara Ocidental sobre o domínio do Marrocos. Nesse território, as histórias de torturas, prisão e sequestros de militantes saharauis são intensas ainda hoje e os registros assustam (em breve um texto somente sobre isso!). 
3- Território Liberado, uma faixa vizinha ao muro, reconquistada pela Frente Polisario durante os anos de guerra.

A historia é longa, o conflito merece atenção, portanto, vou publicar em partes as informações, em breve um texto sobre a Frente a Polisario.


Jaima - Smara - Campo de refugiado saharaui - Tindouf - Argélia

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

São mais de 2.500 kms de muro, com minas cercando todo o território e nós cruzamos por várias delas. Os saharauis estão há 37 anos em Exílio e apesar da opressão do gigantesco muro, eles são exemplos de cidadania, de respeito, de esperança e certeza de uma pátria livre: RASD - Republica Arabe Saharaui Democratica. Sahara Ocidental Livre Já!

Que o Brasil reconheça a RASD!


domingo, 2 de setembro de 2012

Silêncio

Silêncio.
Mentira.
Aqui nenhum silêncio.
Mente que não pára, imagens que não param...

Gente que fala e que fala e que fala.
Eu que falo e que falo e que falo.

Vazio barulhento.
Desconforto do desconhecido.

- Outro vinho, posso?
- É assim, de repente é assim... Vc olha por lado e a pessoa deixa de estar. Foi levada com o vento. Dela só ficaram as fotos, o rosto jovem, o silêncio interminável e as roupas que era preciso desfazer.

A menina mais nova brinca com boneca, de construir casinhas, de colocar tijolinho sobre tijolinho.

- Posso pegar outra taça de vinho?
- ... (balança a cabeça).